Política interna de prevenção ao suicídio: por onde começar — e o que a OMS/OIT recomendam sobre a gestão de riscos psicossociais
- Redação SMR
- há 4 dias
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Atualizado: há 21 horas

“Tudo bem por aí?” Parece um começo simples, quase burocrático, nas reuniões de segunda. Mas, quando a pergunta vira cultura — e não apenas um ritual — ela se transforma no primeiro degrau de uma política interna que protege vidas.
Nos últimos anos, organizações do mundo todo foram chamadas a olhar para os riscos psicossociais com a mesma seriedade dedicada à segurança física. A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) publicaram diretrizes específicas sobre saúde mental no trabalho e prevenção de danos — incluindo risco de comportamento suicida — com recomendações práticas para empresas, líderes e equipes. O ponto de partida é claro: tratar a saúde mental como tema de gestão, com metas, processos, responsabilidades e resultados.
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Por que a empresa precisa de uma política — e não só de ações pontuais
Além da dimensão humana, o impacto é econômico e operacional. Estimativas da OMS/OIT indicam que transtornos mentais atingem cerca de 15% dos adultos em idade de trabalho e representam, globalmente, perdas anuais de produtividade na casa de centenas de bilhões de dólares. Em paralelo, longas jornadas, metas inalcançáveis, falta de autonomia, assédio e insegurança no emprego aparecem entre os principais gatilhos organizacionais associados a sofrimento psíquico. Políticas internas servem justamente para reduzir esses riscos na fonte — antes que se convertam em adoecimento e crises.

O que dizem as diretrizes da OMS/OIT (e como isso vira prática)
As diretrizes recentes da OMS sobre saúde mental no trabalho pedem que as empresas: identifiquem e mitiguem riscos psicossociais; fortaleçam as competências dos gestores para conversas de cuidado e gestão saudável; ofereçam intervenções baseadas em evidências para trabalhadores; criem políticas de retorno ao trabalho seguras e não discriminatórias; e estabeleçam mecanismos de apoio em momentos críticos. Nada disso é “palestra isolada”: é desenho de processos, com orçamento, metas e acompanhamento.
Na mesma linha, a OIT sustenta que violência e assédio — incluindo assédio moral e sexual — são riscos ocupacionais e precisam constar do sistema de gestão de saúde e segurança, com prevenção, canais de denúncia confiáveis e proteção contra retaliação. Incorporar essa lente é parte essencial de qualquer política de prevenção ao suicídio, porque ambientes hostis e a sensação de desamparo elevam o risco.
Política interna de prevenção ao suicídio: o que realmente muda no dia a dia
Uma boa política é uma peça viva, que organiza responsabilidades sem engessar a escuta. Na prática, ela costuma trazer:
Propósito e princípios: linguagem clara contra o estigma, compromisso com confidencialidade e não discriminação.
Gestão de riscos psicossociais: mapeamento periódico de fatores organizacionais (carga e ritmo de trabalho, autonomia, previsibilidade, relações, justiça organizacional) e plano de ação para reduzi-los na origem.
Capacitação de lideranças: treinamento contínuo para reconhecer sinais de sofrimento, conduzir conversas difíceis, ajustar trabalho e acionar fluxos de apoio — sem transformar o gestor em terapeuta.
Fluxos de ajuda: canais de acolhimento 24/7 (internos e externos), triagem segura, primeiros socorros psicológicos e rede de encaminhamento clínico quando necessário.
Retorno ao trabalho: adaptações temporárias, revisão de metas e acompanhamento pactuado, com foco em reintegração e não punição.
Governança e dados: indicadores agregados (nunca identificáveis) para monitorar clima, carga, rotatividade e afastamentos; auditorias internas do sistema de gestão.
Repare que boa parte do esforço está em prevenir: reduzir causas organizacionais de sofrimento, e não apenas responder a crises. É aqui que normas de gestão entram como aliadas: a ISO 45003 (primeira norma internacional de diretrizes para saúde psicológica no trabalho) orienta como integrar riscos psicossociais ao sistema de gestão de SST, com avaliação de perigos, participação dos trabalhadores e melhoria contínua.
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Tons, tempos e territórios: como começar de forma responsável
Toda empresa tem seu ritmo — mas alguns movimentos iniciais fazem diferença:
1) Escuta segura e diagnóstico honesto. Antes de escrever qualquer documento, entenda como as pessoas estão. Use pesquisas anônimas, grupos focais e dados já existentes (absenteísmo, rotatividade, incidentes de assédio). A meta não é “provar” que está tudo bem, e sim descobrir onde agir primeiro. As fichas caem depressa quando a liderança topa ouvir sem se defender.
2) Patrocínio executivo de verdade. Políticas protegidas “no PDF” morrem no primeiro conflito entre meta e saúde. O board precisa assumir compromissos públicos: metas “do quê”, “por quê” e “quanto vamos investir”. Diretrizes OMS/OIT são claras: sem liderança engajada, nada se sustenta.
3) Treinar líderes para conversas difíceis. A OMS recomenda capacitação específica de gestores. Isso inclui: como notar mudanças de comportamento; como abrir espaço sem julgar; como lidar com riscos imediatos; como ajustar trabalho e direcionar para ajuda. Quando o gestor aprende a ouvir, o clima muda — e os números, também.
4) Escrever curto, implementar longo. A política deve ser clara e acessível. O robusto vem da implementação: ritos de equipe (1:1 de qualidade, revisão de carga), metas sustentáveis, pausas e previsibilidade, combate ativo a assédio e violência (alinhado à Convenção 190 da OIT).
5) Cuidar da comunicação e da confidencialidade. A mensagem precisa ser empática, sem sensacionalismo, e os fluxos de acolhimento, discretos e confiáveis. A experiência de pedir ajuda tem que ser tão fácil quanto abrir um chamado de TI — só que com sigilo e sensibilidade redobrados.

Quando risco vira urgência — e como a empresa se posiciona
Mesmo com prevenção, crises acontecem. Numa política responsável, há protocolos claros para risco agudo: quem contatar, como garantir segurança imediata, como acionar recursos clínicos e como comunicar sem expor ninguém. Lembre que a empresa não substitui a rede de saúde — ela cria as condições para que a pessoa chegue até ela.
No Brasil, o CVV – Centro de Valorização da Vida oferece apoio emocional voluntário e sigiloso 24 horas, pelo 188 (ligação gratuita) e chat, e-mail e WhatsApp no site oficial. Divulgar esses canais é medida simples, de alto impacto e custo zero.
E o ROI? O retorno que não cabe só na planilha
Há sempre quem pergunte “quanto isso custa”. A pergunta correta é “quanto custa não fazer”. A OMS/OIT destacam que ambientes de trabalho saudáveis reduzem afastamentos, rotatividade e presenteísmo — e sustentam produtividade de verdade (aquela que não queima gente pelo caminho). Estratégia de saúde mental não é mimo: é gestão de risco, reputação e continuidade de negócios.
Em resumo (sem perder a nuance)
Prevenir suicídio e gerir riscos psicossociais não é um projeto de RH: é uma decisão de gestão. Exige métricas, orçamento, patrocínio da alta liderança e coragem para mexer onde dói — metas, processos, poder e cultura. As boas notícias? As referências existem (OMS/OIT, ISO 45003); os aprendizados se acumulam; e ninguém precisa começar do zero.
Se a sua empresa quer transformar intenção em prática, a SMR Contábil pode ajudar a traduzir diretrizes em processos, alinhar políticas à legislação e integrar indicadores de forma ética e segura. Quando o cuidado entra na rotina, todo mundo trabalha melhor — e volta para casa inteiro.
Fontes essenciais para quem vai implementar:
OMS/OIT – Mental health at work: policy brief (visão geral, dados e recomendações). (Organização Mundial da Saúde)
OMS – Work-related risk factors for mental health (fatores de risco e medidas organizacionais). (Organização Mundial da Saúde)
ISO – ISO 45003: Psychological health and safety at work — Guidelines for managing psychosocial risks (norma de diretrizes).
OIT – Violence and Harassment Convention, 2019 (No. 190) (marco sobre violência e assédio no trabalho). (Organização Mundial da Saúde)
CVV – Centro de Valorização da Vida (apoio 24h pelo 188 e canais digitais). (DNV)
⚠️ Se você ou alguém do seu time estiver em risco imediato, procure ajuda profissional agora. No Brasil, ligue 188 (CVV) ou acione o serviço de emergência local.